
Nem réstia de luz
Périplo é viagem. A minha é infinita... Sempre começando a mesma minha incursão em mim. E começá-la!
Escorregou as costas frias pela parede de ladrilhos brancos cinzentos do banheiro até o chão. Perdidos olhos no muito vazio, fixavam-se no nenhum lugar.
trabalho vazio
casa vazia
coração vazio
O tubo de pasta de dentes vazio detonara seu perdimento.
Quando ainda quase no fim, havia renovado, na semana última, os votos da insípida vida a dois nada conjugada.
Todos esses pra trás dias, o tubo magro, retorcido já, dava um tico espesso da substância única que comungava com o marido. Hóstia pastosa, espremida, ungia, como uma nesga de esperança. Instava que tudo ia bem. Resíduo das coisas, lembranças, de uma quase alegria difusa que povoava a memória gasta do apartamento.
Resistira restando a gosma branca da pasta que ele retirava com força, um pouco antes dela, que fingia dormir pra não se despedir, na cama, espaço um dia de rito, agora de sacrifício.
Hoje, tubo findo, procurara em vão um tubo outro de pasta de dentes nos mofados armários e via, afinal, que as sobras eram nada.
O conforto do cômodo incomodava seu corpo com o peso amassado do tubo.
Pegou a bolsa, as chaves do carro e ia saindo, depressa, portas abertas, lembrou-se de deixar-lhe um bilhete:
“Desculpe, a pasta de dentes ficou vazia.”
vagalumiavam luzes
pequenas
no mais noite do jardim,
pisca piscando
no breu
imitavam estrelas
meus olhos perdidos nas vistas...
rodopiante morcego
retraz a escuridão num susto!
voo tronxo: vaievem.
vai e vem
vai
e
vem
- nos seus escuros,
- Mô?!
- Humpf
- Mô?!
- Hummmm?
- Seu coração tá de cabeça pra baixo.
- Hum!?
- Ô Mô! Môôôô...
- Hum, Hum????
- Seu coração tá de cabeça pra baixo!
Ele se levanta um pouco e toca inconsciente o peito, antes mesmo de sentir as batidas escorrega na cama... e dorme novamente.
- Mô! Seu coração...seu coração, Mô, tá de cabeça pra baixo!!!
- Tá. Já vi! Tá bom. Hã, hã!
- Ah, Otávio, assim não dá! Tô falando que o seu coração tá de cabeça pra baixo, pô! - Ela fala rispidamente, quase gritando, e ele senta na cama. Olha em volta, os olhos vermelhos-transe. não vêem nada. Desliza até o travesseiro e dorme.
- Ahhhhhhh, levanta vai, senão eu não consigo dormir. Já disse mais de mil vezes que seu coração tá de cabeça pra baixo!!!
Ele levanta irritado, olha ao redor com olhos inquisidores...
- Que porra de coração de cabeça pra baixo é essa!? Que coração, caralho?
- Aqui, ó!
Ele olha pra baixo e vê a fronha, estampada de corações, de cabeça pra baixo. Energicamente arruma o travesseiro.
- Pu-ta-queo-pa-riu. Pronto! Agora dorme. E me deixa dormir. Tá lôco, viu!
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- Mô?
- Que é?!
- Cê tá dormindo?
Última coisa que queria era entediá-los com postagens particulares, mas o êxtase da semana não permite passar em branco.
A ressaca de domingo provocou inquietações, resultado: Périplo.
O aniversário de São Paulo revolveu antigas e novas emoções...
A volta, sempre conturbada e dolorosa ao trabalho, implica em esperar o desconhecido. Delicioso desassossego.
Os 250 acessos ao Périplo, em tão pouco tempo, carinho inominável!
A namorada do Ugo (meu jabuti) aqui e a possibilidade de jabutizinhos.
A premiação de Através dos Bosques – toda a magia que advém de Júlio Cotázar.
Como diria Mary Poppins, SUPERCALIFRAGILISTIQUESPIRALIDOSO!
Sinto-me irremediavelmente lírica!
Todo meu humor acre e a azedura constante de meus pensamentos se dissiparam esses dias. Descuidei-me...
Deixei-me invadir por essas horinhas de descuido.
Com toda humildade aproveito, aceito aquilo que é fugaz e delicioso.
Mas não vou pedir desculpa pela pieguice de falar de minhas emoções tolas.