voyeur

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Ampulhetas



15''

no barulhento silêncio das horas vazias

surpreendo o Tempo desprevenido,

a descansar da eterna idade.

1'

tenho pensado no tempo

passando

tenho perdido tempo

pensando

fico a mercê do tempo

perdendo


tudo tão rápido, tão lento.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

O vazio da pasta de dentes





Escorregou as costas frias pela parede de ladrilhos brancos cinzentos do banheiro até o chão. Perdidos olhos no muito vazio, fixavam-se no nenhum lugar.

trabalho vazio

casa vazia

coração vazio

O tubo de pasta de dentes vazio detonara seu perdimento.

Quando ainda quase no fim, havia renovado, na semana última, os votos da insípida vida a dois nada conjugada.

Todos esses pra trás dias, o tubo magro, retorcido já, dava um tico espesso da substância única que comungava com o marido. Hóstia pastosa, espremida, ungia, como uma nesga de esperança. Instava que tudo ia bem. Resíduo das coisas, lembranças, de uma quase alegria difusa que povoava a memória gasta do apartamento.

Resistira restando a gosma branca da pasta que ele retirava com força, um pouco antes dela, que fingia dormir pra não se despedir, na cama, espaço um dia de rito, agora de sacrifício.

Hoje, tubo findo, procurara em vão um tubo outro de pasta de dentes nos mofados armários e via, afinal, que as sobras eram nada.

O conforto do cômodo incomodava seu corpo com o peso amassado do tubo.

Pegou a bolsa, as chaves do carro e ia saindo, depressa, portas abertas, lembrou-se de deixar-lhe um bilhete:

“Desculpe, a pasta de dentes ficou vazia.”

terça-feira, 19 de julho de 2011

despertar da inconsciência


"A consciência da inconsciência da vida
é o mais antigo imposto à inteligência"
(F. Pessoa, Livro do Desassossego, frag. 68)





Mesmo aquele, nulo de consciência, néscio de tudo, tem o seu momento.
De repente, o cérebro, num impulso vital, pulsando por existir , expele algo: um raciocínio, uma síntese ... talvez até um pensamento.
Enfim, ele caga.